quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Lacticínios - São benéficos?

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O texto abaixo é de Francisco Varatojo, diretor do Centro de Macrobiotica Português.

"Na época actual, a população adquire cada vez mais a consciência de que uma boa alimentação é vital para a manutenção da saúde e bem estar. Cada vez mais pessoas reduzem o consumo de carne, açúcar, “fast food” e procuram nas lojas e mercados produtos naturais, alimentos integrais e biológicos.
No entanto, devido a toda a publicidade veiculada na comunicação social e em grandes cartazes espalhados nas ruas, o leite e os lacticínios continuam a ser considerados alimentos saudáveis, essenciais, quase sacrossantos: necessitamos de beber leite todos os dias para obter o cálcio necessário à formação e manutenção da massa óssea e assim evitar a osteoporose.
Escrever um artigo refutando tais afirmações e mencionado que o leite e os produtos lácteos não são assim tão saudáveis pode parecer uma total heresia, mesmo um perigo para a saúde pública. No entanto, alguns dos mais conceituados nutricionistas e médicos mundiais afirmam categoricamente que o consumo de produtos lácteos não evita a osteoporose e que podemos viver com melhor saúde quando nos abstemos de os ingerir.
Na realidade, o número de cientistas que acha que o leite e seus derivados não são bons para a saúde cresce todos os dias: Frank Oski (médico, director do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina John Hopkins e Médico-Chefe do John Hopkins Children’s Center), Walter Willet (médico, presidente do Departamento de Nutrição da Harvard Public School e Professor de Medicina da Faculdade de Medicina de Harvard), Lawrence Kushi (nutricionista, responsável por inúmeros estudos epidemiológicos e professor de Nutrição na Faculdade de Columbia de Nova Iorque), Colin Campbell (médico, Professor na Faculdade de Medicina de Cornell e responsável pelo maior estudo de nutrição até hoje realizado, o China Health Project), o falecido Benjamin Spock (médico), Neal Barnard (médico), John McDougall (médico) e muitos outros nomes conhecidos na comunidade científica internacional têm escrito e realizado alocuções públicas em que condenam veemente o uso dos produtos lácteos, afirmando que toda a publicidade feita aos mesmos não passa de uma fraude científica encabeçada por empresas comerciais.
Citando Walter Willet no recente livro publicado pela Escola Médica de Harvard, “Eat, Drink and Be Healthy”: “… os produtos lácteos não deviam ocupar o lugar proeminente que ocupam na Pirâmide Alimentar do Ministério da Agricultura Americano, nem deviam ser o cerne da estratégia nacional para prevenir a osteoporose. Em vez disso, os factos mostram-nos que o cálcio alimentar deve ser oriundo de uma variedade de fontes…”, ou “…mas o leite dá-nos mais do que apenas cálcio e alguns dos seus componentes – como calorias extra, gordura saturada, e açúcar conhecido como galactose – não são necessariamente bons para si. E mais, cerca de 50 milhões de adultos nos Estados Unidos não conseguem digerir completamente o açúcar conhecido como lactose. Como não o consegue fazer a maioria da população mundial”.
Sei que o que está a ler lhe pode parecer chocante, mas considere os seguintes factos:
Países do Mundo com maior consumo de lacticínios per capita: Finlândia, Suécia, Estados Unidos da América, Inglaterra.
Países do Mundo com maiores índices de osteoporose per capita: Finlândia, Suécia, Estados Unidos da América, Inglaterra.
Ingestão de cálcio na China rural: metade da ingestão da população americana.
Fracturas ósseas na China Rural: 5 vezes menos do que na população americana.
O que os diferentes estudos científicos apontam, praticamente sem excepção, é que absorção de cálcio depende de muitos mais factores do que a simples ingestão de lacticínios; os factores mais importantes parecem ser:
O tipo de alimentação que se tem – Uma alimentação com alto teor de proteína de origem animal como é a alimentação moderna, faz com que o organismo excrete muito mais cálcio; quanto mais proteína animal comemos, mais cálcio perdemos.
O grau de actividade física – A actividade física é essencial para a fixação de cálcio nos ossos; um pequeno passeio diário de meia hora pode operar maravilhas no que toca à prevenção da osteoporose.
Produção de hormonas reprodutoras como estrogéneos e testosterona – Redução na produção destas hormonas (estrogéneos nas mulheres, testosterona nos homens) torna difícil produzir e recriar massa óssea.
Vitaminas D e K – Estas vitaminas desempenham um papel importante na absorção e fixação de cálcio.
Apesar de a osteoporose não ter que ver apenas com o consumo de cálcio este é no entanto necessário; contudo, os lacticínios não são de forma alguma os únicos detentores deste mineral. Os vegetais verdes de rama fornecem a mesma quantidade de cálcio do que o leite, assim como por exemplo as oleaginosas.
As algas contêm uma quantidade muito superior de cálcio, algumas como a Hiziki, 14 vezes mais de cálcio por 100 gramas.
Em debates ou conferências em que menciono a quantidade de cálcio doutros alimentos é-me geralmente respondido que é verdade que outros alimentos contêm a mesma ou uma maior quantidade de cálcio, mas que este não é bem absorvido no sistema digestivo, não é “bio-disponível.”
Os factos, parecem contudo ser diferentes. Segundo o “American Journal of Clinical Nutrition” a absorção de cálcio de diferentes alimentos é, por exemplo, a seguinte:
Couve de Bruxelas – 63.8%
Brócolos – 52.6%
Rama de nabo – 51.6%
Couve – 50%
Leite de vaca – 32%
Portanto, não é apenas possível obter cálcio a partir de muitos outros alimentos, como é tão bem ou melhor assimilado que no leite de vaca.
Gostaria de frisar que não sou contra o consumo de lacticínios, apesar de achar que é perfeitamente dispensável, se assim se desejar; publicitar o seu uso como sendo absolutamente essencial para a saúde, nomeadamente para a osteoporose é, no mínimo, revelador de falta de informação e parece-me também ser pouco ético. Até hoje, ainda não vi qualquer estudo onde tal conclusão fosse evidente e inequívoca.
Mas, para além do tema da osteoporose, os lacticínios podem também não ser tão benéficos para a saúde como nos diz a publicidade, em especial quando consumidos em enormes quantidades como o faz a população moderna.
Pessoalmente, acredito que existe uma certa ordem natural que devemos seguir e dentro dessa ordem não somos um ser com características para ingerir leite ou derivados: como mamífero que somos, a ordem natural (que se aplica a todos os mamíferos) é sermos amamentados com leite materno até cerca de um ano, para depois sermos desmamados e começarmos a comer alimentos sólidos.
Na realidade, o ser humano é o único animal que após desmamado continua a ingerir leite e ainda por cima de uma outra espécie. Basicamente, o leite de vaca é um alimento ideal para nutrir um bezerro que aumenta nas primeiras semanas cerca de 37 quilos; um bebé humano, no mesmo espaço de tempo, aumenta apenas 1 a 2 quilos.
Walter Willet, professor de nutrição na prestigiada Universidade de Harvard, mencionado por mim no último artigo, cita e corrobora com factos aquilo a que ele chama o “Lado Negro do Cálcio e dos Produtos Lácteos” . Para ele, as principais razões para evitar o consumo de leite e produtos lácteos são:
Intolerância à lactose
Gordura saturada
Calorias extra
Aumento do risco de cancro na próstata e possivelmente um aumento de risco de cancro nos ovários
.
Dos pontos acima citados, gostaria de referir:
Intolerância à lactose - A maioria da população mundial é intolerante à lactose, o açúcar presente no leite de vaca. A maioria das pessoas após os 4 anos de idade perde a capacidade de fabricar lactase, o enzima responsável pela digestão da lactose e apenas 25% da população mundial consegue digerir bem o leite. A intolerância à lactose manifesta-se em sintomas como diarreia, prisão de ventre, cólicas, náusea. Dos diferentes grupos étnicos, a intolerância à lactose é a seguinte: de descendência asiática – 90 a 100%, de descendência africana – 65 a 70%, de descendência hispânica ou italiana – 50 a 70%, de descendência caucasiana – 10%.

Gordura saturada – A gordura presente nos lacticínios é gordura saturada, responsável pela obstrução dos vasos sanguíneos que está na origem da maioria das doenças cardiovasculares modernas.

Cancro na próstata – Em nove estudos independentes sobre o desenvolvimento do cancro na próstata, o factor mais forte e consistente ligado a este tipo de cancro foi o consumo elevado de lacticínios. No maior destes estudos o “Health Professionals Follow-up Study”, os homens que bebiam 2 ou mais copos de leite por dia tinham mais do dobro das hipóteses de desenvolver cancro da próstata avançado ou com metástases do que aqueles que não bebiam leite nenhum.

Cancro nos ovários – Existe um número significativo de estudos que apontam para a hipótese de o cancro nos ovários estar ligado ao consumo de produtos lácteos e apesar de tais estudos não serem conclusivos, a ligação parece ser demasiado forte para não ser considerada.

Antibióticos – O uso de antibióticos misturados na ração diária das vacas é enorme. Nos Estados Unidos, por exemplo, a vasta maioria dos antibióticos é utilizada nos animais e não em pessoas (isto apesar do seu uso em hospitais ter aumentado 100 vezes em 35 anos). Esses antibióticos acabam por ir parar ao leite e à carne, o que não me parece de todo ser benéfico. É bem possível que a resistência crescente de algumas bactérias aos antibióticos esteja ligada ao seu uso indiscriminado na cultura pecuária.
No meu caso pessoal deixei de consumir leite e produtos lácteos (um alimento que consumia em quantidades copiosas) há 24 anos e pouco tempo depois os sintomas de uma colite e de uma sinusite desapareceram completamente, até hoje. Na realidade, tenho testemunhado num número incontável de pessoas, melhoras extraordinárias em problemas como colite, sinusite, otite, asma e outros problemas respiratórios, alergias, quando deixam de consumir lacticínios e, em especial, quando deixam de comer lacticínios e açúcar.
Tenho a noção de que os dados apresentados nestes dois artigos sobre o leite são perturbadores, em particular quando a maioria da informação veiculada pela publicidade e comunicação social nos diz que este é essencial. Deve no entanto considerar que a informação veiculada pela publicidade pode não ser consubstanciada por factos. Nos Estados Unidos, por exemplo, a FDA (Food and Drug Administration) proibiu as empresas produtoras de lacticínios de colocarem nas embalagens qualquer publicidade referente às vantagens destes alimentos porque de acordo com as regras da FDA é obrigatório corroborar as frases publicitárias com factos concretos e estes nunca são apresentados.
Não pretendo de todo com estes artigos semear o pânico ou ser o arauto da desgraça. Penso no entanto que é meu dever alertar e mostrar o outro lado da moeda, de forma a que se possa questionar o que às vezes parece ser inquestionável, informar-se e assumir tomadas de decisão conscientes sobre o estilo de vida e alimentação."

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